Estória: narrativa de lendas, contos tradicionais de ficção.

História: narração ordenada, escrita dos acontecimentos e actividades humanas ocorridas no passado.

quarta-feira, 6 de junho de 2007

A Coca / Procissão do Corpo de Deus


Monção é a terra da "Coca" ou "Santa Coca" ou, ainda, da "Coca Rabixa"! As lutas do Bem sobre o Mal, da Verdade sobre a Mentira, do Arcanjo S. Miguel sobre o Dragão são significados religiosos que, sobretudo, na Idade Média tiveram manifestações próprias, inclusivé, nos préstitos religiosos, infelizmente, desaparecidos no Alto Minho.


A «coca» monçanense está intimamente ligada à procissão do "Corpus Christi" e à conhecida lenda de S. Jorge: "S. Jorge acudindo ao apelo angustiado de uma jovem princesa, filha do rei da Líbia, mata com a sua lança, o dragão que a queria devorar. Esta impressionada pela heroicidade do santo converteu-se ao cristianismo". S. Jorge. O culto de S. Jorge nasceu no Oriente e ficou localizado, durante muito tempo, na Palestina, na Lícia e entre os coptas do Egipto, onde a cidade de Gegth lhe era consagrada. Foi daí que passou a Constantinopla, que lhe dedicou, na Ponta do Serralho, um grande mosteiro, chamado S. Jorge de Manganes.


Para Garção Gomes, a Festa do Corpus Christi, em Monção, data, possivelmente, dos princípios do Séc. XIV. Porém, os Acordãos que possuimos referem-se ao Séc. XVII : «nomeação do mordomo da serpe (mordomo dos alfaiates)» Lº de Acc., em 4/1/1634 ; «condenados aos mordomos dos taberneiros e aos dos ferreiros em mil réis cada um por não virem com as suas danças na procissão do dia de Corpus Christi, Lº de Acc, em 17/6/1634.


Em harmonia com a tradição, a "Coca" simbolizando o dragão, a que o povo tanto gosta de chamar "Santa Coca", "Diacho da Coca" ou, ainda, "Coca Rabixa", «Por bia da Santa Coca rabixa / perdi o diacho da Missa», Sai na manhã da procissão do Corpo de Deus, "passeando" pelas ruas de Monção. À mesma hora, S. Jorge adestra o seu ginete, em tempos idos um galego que representava, no auto, o Santo da Capadócia.


Na procissão, a que não falta o "Carro das Hervas", cheio de verdura e rapaziada; São Cristóvão, o advogado das crianças "biqueiras"; o "Boi Bento", todo enramilhetado de fitas e cores, vão as duas figuras principais do auto – a "coca", arrastando-se vagarosamente pelas ruas e calçadas, um monstro anfíbio de escamas reluzentes, com largas queixadas móveis e uma língua tremulante implantada em cabeçorra que volta à direita e à esquerda,, criando um misto de espanto e incrudelidade aos inúmeros devotos da «rabixa»; logo seguida de S. Jorge, em carne e osso, vestido a rigor, armado de lança e espada, capacete e broquel, e montado em cavalo de verdade. Procissão acabada, toda a gente, se desloca para o Campo do Souto. Aí, ofegante, vaidosa, inchada, pousona, a Santa Coca! S. Jorge media, ao largo, o "bicharoco", enquanto o cavalo, não habituado a multidões, se mostrava inseguro e nervoso. Ao impulso dos "comparsas" que se ocultavam no bojo da "bicha" e que a manobravam a seu bel-prazer, a Santa Coca vai a terreiro para o combate! Começa, então, o terrível combate !


A Coca em Redondela

Em Redondela (Galiza), a mesma questão se põe. O documento mais antigo provém de um documento do Bispo de Tui que lembra as obrigações das Paróquias e Confrarias em apresentar a dança das Espadas e das "Penlas", a "Coca" ou "Tarasca" ou "Monstro Marinho", na Procissão do Corpo de Deus (1627). Felizmente (e tal qual em Monção), o costume mantém-se.


A dança das Espadas recorda a mítica luta contra o monstro marinho que surgia em noites de grandes tempestades, raptando as raparigas casadoiras, semeando pânico e sujeição a que os marítimos de Redondela puseram cobro, matando o monstro. A dança das "penlas", em honra do Santíssimo Sacramento, consiste no seguinte: meninas são colocadas aos ombros de jovens raparigas executando graciosos movimentos de danças regionais. Outras Manifestações do Corpo de Deus (Tapetes Floridos).




Transcrito e foto de: RTAM

A Vaca das Cordas: véspera da Procissão do Corpo de Deus


Este velho costume da introdução da «Vaca das Cordas» (Ponte de Lima) na véspera da procissão do Corpus Christi, filia-se nos cultos egípcios de Isis, Osíris e Apis, trazidos para a Peninsula pelos fenícios, aceites pelos romanos e suevos e tolerados pelos cristãos (como o Boi Bento e a Serpe de Lerna).

É que no Olimpo, os Deuses também se apaixonavam! Segundo a mitologia, Io, filha do rei Inaco e de Ismene, linda como os amores, foi raptada por Júpiter. Juno, irmã e mulher deste, não esteve pelos ajustes e daí a sua perseguição a Io. Júpiter como qualquer mortal, temendo a mulher, metamorfoseou a apaixonada em vaca mas Juno, que lia os pensamentos do sublime adúltero, mandou do céu à terra um moscardo ciumento, incumbido de aferroar, incessantemente, a infeliz Io.

Assim, perseguida, Io fugiu para o Egipto onde Júpiter vendo-a tão desconsolada (diz a lenda que a bela vaca chorava rios de lágrimas, que juntas formariam o Nilo (!), a restituiu à forma natural, fez-lhe um filho (Epafo) e casou-se com Osiris, também adorado com o nome de Ápis. Os egípcios levantaram altares a Io debaixo do nome de Isis e exibiram nas solenidades, como seu símbolo, uma vaca errante, corrida. Ora, Isis, a vaca de Júpiter, a deusa da fecundidade teve um culto especial, precisamente, na Região Galaico-Bracária na área de Entre Douro e Minho, no Convento Bracaraugustano, concretamente, numa dependência administrativa judicial do distrito dos Límicos!



Vai ser ainda o Padre Roberto Maciel (in Almanaque Ilustrado de «O Comércio do Lima» 1908), quem nos vai ajudar a explicar a tradição da «vaca das cordas». Diz-nos o Revº Abade : A igreja Matriz da primitiva vila era um templo pagão dedicado a uma deusa, que, converteram em templo cristão a igreja, tiraram do nicho a imagem da deusa vaca, prenderam-na com cordas, com ela deram três voltas à igreja e depois arrastaram-na pelas ruas da vila, com aprazimento de todos os habitantes. Daí o tradicional costume da «vaca das cordas» pelas ruas, para gáudio do rapazio e até dos mais velhos, com tanto que se pilhem seguros bem longe da rede que os da corda costumam lançar-lhes.


Transcrito e foto de: RTAM